19 de abril de 2013

Revista VISÃO escolhe Escritor Português Residente em Tóquio como uma das "Caras do Futuro"


António Lobo Antunes - Escritor

"Escolhi o nome de Ricardo Adolfo como poderia ter escolhido outros - esta geração, que é mal entendida pela crítica de jornal, é bastante melhor do que a minha. Li os seus livros principais. Mizé - Antes Galdéria do que Normal e Remediada parece-me ter grandes qualidades. Ricardo Adolfo tem uma voz original e pessoal, uma capacidade de diálogo fora do vulgar, uma capacidade de criar ambientes, de recriar o subúrbio de Lisboa, uma maneira de falar completamente nova, na Literatura Portuguesa. Depois, publicou Maria dos Canos Serrados, que marca um grande avanço em relação ao romance anterior e que, se fosse trabalhado, poderia ser um grande livro."

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Ricardo Adolfo, 38 anos, copywriter e escritor, não necessariamente por esta ordem. Vive há um ano em Tóquio, onde trabalha como freelancer na área da publicidade. 

Ricardo Adolfo adora diálogos e, nos seus livros, isso nota-se. Em Tóquio, onde vive há cerca de um ano, acha que as frases soltas que ouve nos transportes públicos versam quase sempre a gastronomia. Os japoneses, garantem-lhe, falam muito sobre comida. Ele, lost in translation, pouco percebe, mas acredita que seja verdade. Também gosta de sentir, admite, um certo desconforto, de se perder não só na língua como nos caminhos urbanos por onde se mete sem, depois, ser capaz de regressar. É emigrante - ele é que usa a palavra - há 14 anos e, para já, não pensa voltar. 

Nasceu em Luanda em 1974. A família seguiu logo, de "abalada", como conta, para Portugal. Ricardo Adolfo cresceu na Linha de Sintra, a ouvir as conversas nos cafés em que se jogava snooker, em Mem Martins, onde ainda hoje tem os seus amigos. Nos anos 80, viveu em Macau, durante uns tempos. Pensou tirar antropologia, acabou por ir para publicidade, no IADE. Em Lisboa, trabalhou em algumas agências e, aos 25 anos, mudou-se para Amesterdão com a "ilusão" de que lá poderia tirar outra satisfação do que fazia. Percebeu, depois, que não podia pedir tanto à escrita para publicidade. Teve dificuldades com o inglês, até perceber que a sua "maior desvantagem" poderia ser também a sua "maior vantagem". Deu a volta às palavras, perverteu o idioma e, para encurtar razões, tornou-se "exótico". 
Foi para Londres, regressou à Holanda e começou a escrever as suas próprias histórias, além das campanhas, das marcas e dos logótipos. A publicidade deu-lhe disciplina de escrita, o gosto pelo trabalho em equipa, alguns encontros felizes (filmou com Wong Kar-Wai). E "financiou-lhe" a literatura: "O grande problema é que preciso de comprar o tempo para escrever. E esse tempo é muito caro." Tem cinco livros publicados, todos na Objetiva: Os Chouriços São Todos para Assar (contos), Os Monstrinhos da Roupa Suja (para crianças), Depois de Morrer Aconteceram-me Muitas Coisas, Mizé - Antes Galdéria do que Normal e Remediada e Maria dos Canos Serrados (romances). Interessa-se pelo que não interessa, pela "vidinha", pela "vida de bairro", pela "vida diária e corriqueira", tentando "tirar daí algo mais precioso". Assume-se "duplamente suburbano": "Portugal é um país suburbano, não faz parte do centro e, por isso, ao escrever sobre Portugal, já estou a escrever sobre um subúrbio." As suas personagens têm "um estilo de vida banal" (não quer saber das que "vivem em revistas como a Wallpaper ou a Monocle"). E falam mal, expressam-se mal, pronunciam mal as palavras, dão erros de sintaxe. "É nos seus erros que tento encontrar alguma beleza."